Lendo a frase "O Mestre aponta o caminho; o discípulo segue sozinho até encontrar novamente o Mestre, mas, desta vez, dentro de si mesmo." de Henrique José de Souza, fiquei pensando sobre os caminhos meus e de tantos que procuram respostas para suas mais intimas perquiriçoes sobre o crescimento humano e espiritual dos individuos.
Meu primeiro texto academico foi a monografia de final do Curso de Pedagogia, na qual eu tratava da relaçao mestre-discipulo, abordada numa perspectiva da teoria de Paulo Freire e de Moacir Gadotti, via Georges Gusdorf. A ideia de que um mestre so é mestre quando seu discipulo se torna também um mestre e dele ja nao necessita, era a tese central dos meus estudos, e é a consequencia do pensamento de Souza. A diferença é que Souza fala de uma transcendencia espiritual e Freire e Gadotti manifestam nos textos estudados por mim uma preocupaçao explicita com o exercicio do educador formal.
De qualquer maneira todos estao numa dimensao em que o humano esta para além dos limites dos papéis sociais. E um mestre nao é so um professor, um orientador titulado, mas todo aquele que nos serve de interlocutor para ampliarmos nossas reflexoes e visualizarmos um horizonte mais largo e de maior profundidade.
Quando Souza se refere ao Mestre que encontramos em nos mesmos, podemos pensar que a centelha divina, que aquilo que ha em nos se conecta com o todo, e que por sua vez se manifesta por meio de nos, que todas as respostas às nossas duvidas nao estao fora de nos, mas em nosso imo. Jesus ja falava "vos sois deuses". Numa perspectiva holistica, tudo que ha em mim é sintese do que ha no universo, assim, nao ha nada fora que nao esteja dentro. Procurar um mestre fora de nos nao faz sentido, porque o Mestre habita em nos. So que o Mestre precisa se manifestar, falar conosco em nos por meio de nos mesmos. Ai entra o papel primario do mestre exterior que nos incita à busca do Mestre interior, que quando contatado, dispensa o mestre exterior.
Ontem fazendo leituras sobre a obra e o pensamento de Jiddu Krishnamurti, fiquei encantada ao ver a personificaçao dessa ideia. Aos 14 anos, em 1909, ele iniciou sua educaçao dentro das orientaçoes da Sociedade Teosofica, apos ser identificado por um membro como um instrutor do mundo muito aguardado pelos teosofistas. Muito aprendeu em conhecimentos e praticas de meditaçao, porém, seus orientadores o colocaram como lider espiritual da Ordem Internacional da Estrela do Oriente, numa posiçao de futuro guia da humanidade. Depois da morte de seu irmao ele se enfronhou em grandes cogitaçoes internas e foi se afastando da Sociedade Teosofica, até que aos 34 anos, publicamente, se desligou da instituiçao, colocando-se claramente como alguém que nao desejava guiar ninguém em virtude da sua forte crença de que pessoa alguma deve ter lideres ou orientadores para seu caminhar
espiritual pessoal. Afinal, é intransferivel a tarefa de encontrar a si mesmo.
Nao ha caminho verdadeiro, nao ha mestre definitivo, nao ha religiao correta. O que cada um deve fazer é explorar seus potenciais mentais ao maximo para poder vislumbrar em si mesmo a Verdade que nao pode ser oriunda do externo, de uma outra pessoa. Ou seja, ele viveu em coerencia maxima seus pensamentos. Nao aceitou ser lider e se colocou como mais uma pessoa que conversava com outras pessoas, até o final de seus dias em 1986.
E eu também penso assim, apos um longo caminhar de muitos mestres. Em minha formaçao academica dos 17 anos, até o final do mestrado, aos 38 anos, penso que fui muito atraida por orientaçoes externas, fundamentando meu agir nas falas de outros. No aspecto religioso também, tinha uma profunda veneraçao e respeito por orientaçoes dentro das religioes que frequentei, evitando conspurcar as "verdades" ali enunciadas. Mas nao tem jeito, aquilo que em nos se manifesta nao tem como ser calado. Heidegger coloca que em algum momento o ser ha de se manifestar no ente. Aquilo que em mim é essencial nao pode ser sufocado pela pessoa que eu constitui socialmente. Ha uma verdade construida por mim e que, numa perspectiva religiosa, comunga com a minha origem divina, e que de qualquer maneira vai se manifestar para além dos dogmas, dos limites, das restriçoes deliberadas por homens que se afastam de suas vozes interiores. E nao ha voz interior que resista a tanta ritualistica, a tantos catecismos, a tanto fanatismo. E quando nossa voz anterior fala que "ha algo de podre no reino da Dinamarca?" rsrsrsr
Nao tem jeito. Temos que assumir que cada um ha de empreender seu proprio caminho e ser Mestre de si mesmo, com auxilio dos mestres exteriores nao como gurus, nao como guias, nao como salvadores, mas como interlocutores duros e doceis que mexam e remexam nossas crenças mais intimas.
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