Nas coisas simples, como por exemplo cozinhar, sinto, na construçao do meu proprio fazer, um prazer imenso na harmonia dos gestos e no uso dos objetos. A posiçao do meu corpo para a exatidao dos movimentos; a atitude mental concentrada nas sequencias e quantidades; a criatividade latente na substituiçao, recombinaçao ou reordenamento dos ingredientes; a atemporalidade estabelecida no ato de refazer a receita que ha geraçoes se repete e eterniza os atos que proporcionam aromas e sabores comunicados.
Ao mesmo tempo que o ato de cozinhar, ainda que por necessidade, se torne mecanico, pratico e imediato, ha uma experiencia propria ao fazer certas receitas que contem em si uma simplicidade de elementos, de procedimentos, e, ao mesmo tempo, enseja uma coreografia na sua confecçao, gerando uma estética que abarca o rememorar as lembranças da infancia e ver imagens em seus contextos de origem e na continuidade a cada refazimento. Assim para mim sao os biscoitinhos de vinagre... Eu me desloco do meu tempo atual, me projeto no comer e fazer os biscoitinhos, em sequencias em que telas se abrem à minha mente e criam espaços de acolhimento e segurança, dos momentos em que fui mais eu mesma em situaçoes simples como com quem e para quem cozinhar.
Odete, uma parenta do meu pai, sempre tinha um pote com os tais biscoitinhos... pensar e fazer os biscoitos envolve a beleza fisica, a harmonia da organizaçao doméstica, a alegria e simplicidade das expressoes de amizade e carinho com que Odete recebia minha mae e a nos.
A primeira vez em que fiz os biscoitos com minha mae, as amigas que recebia em casa e que participavam de sua confecçao, os meus filhos me ajudando a prepara-los, meu companheiro atual e seu filho furtivamente os buscando na cozinha... imagens de beleza e aparente banalidade...
1 ovo, 3 colheres de sopa de açucar, 3 colheres de sopa de oleo, 3 colheres de sopa de vinagre, 1 colher de sopa de fermento em po, é o inicio do processo. Misturar tudo e ver como elementos tao dispares de conjugam, se amalgamam e criam uma massa crescente, macia, fofa, perfumada... Juntar farinha de trigo refinada aos poucos, buscando constituir uma massa firme e passivel de elaborar, com as maos, pequenos anéis para serem colocados em uma superficie enfarinhada. Depois frita-los em oleo quente, e, ja frios, envolve-los em açucar refinado ou velado e canela.
Quando eu vejo os biscoitinhos no pote, colocados estrategicamente na cozinha por onde passam os olhos gulosos, me da uma sensaçao de paz de colaborar com o adoçar a vida das pessoas da casa, oferecer pequenas alegrias... é ai que eu reproduzo, na minha vida atual, as sensaçoes de paz que a casa da Odete, e a sua figura e os seus biscoitos, marcaram em minha memoria.
Buscar fazer bem feito aquilo que se pode fazer nas pequenas atribuiçoes a que nos propomos, cria significados de beleza e harmonia onde nos colocamos como criadores e fruidores disponiveis para a partilha... simples assim...
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