Li, há muito tempo atrás, um texto de Eduardo Galeano, A história é um profeta com o olhar voltado para trás. A ideia de Galeano se aproxima da concepção corrente de que a profecia fala de um tempo vindouro, porém, para ele, não se trata de adivinhação, mas de que a história não é um mero rememorar, um registro do que sucedeu, mas é o estudo cuidadoso do que sucedeu para apontar os caminhos que devemos seguir. A história não é a realização de um projeto externo à ação do homem, mas é a construção consciente de quem, sabendo das mazelas e conquistas, escolhe caminhos e estratégias. Ou seja, a profecia realiza aquilo que escolhemos. Então quem observa o futuro e indica possibilidades de acontecimentos, só os visualiza porque conhece os caminhos percorridos até então.
O futuro está em nossas mãos, então, visões deterministas que enfeixam o amanhã num prognóstico fechado, não me interessam. Creio, firmemente, que se conhecermos ao máximo nossa própria história pregressa, poderemos com mais segurança dar os próximos passos em nossa vidas. E nem precisa de regressão de memória, penso que basta observarmos nossa própria conduta, pensamentos e reações ao longo do tempo. Vou fazendo uma anamnese a partir dos relatos familiares, das fotografias de sempre, das minhas atitudes, das pequenas às grandes, tudo fala, grita, ecoa quem sou. E daí não é muito difícil profetizar o que sucederá adiante.
Uso também o recurso de mapa astral, taróloga e terapia psicológica, mas em verdade, eu mesma é que sou o meu melhor prescrutador. Tudo auxilia, desde que se queira realmente se conhecer.
As ideias que proferimos são como profecias, são o desejo mais íntimo do que gostaríamos de ser. Somos sempre melhores em nossas falas, em nossas defesas de ideais. Há uma distância considerável entre o que somos e o que queremos ser. Mas de qualquer maneira, profetizar sobre nós mesmos é uma oportunidade de idealizarmos um eu melhor, de projetarmos uma superação das limitações presentes, de acreditar que podemos avançar em progressão.
Penso que o profetizar deve ter uma ambivalência. Em análises calcadas nos nossos erros pregressos e nas indicações que o autoconhecimento permite, podemos nos visualizar no futuro com marcas e eventos péssimos e que nos depreciam, mas ao mesmo tempo, fortalecendo os aspectos bons e agradáveis, podemos programar um percurso que nos permita ir pouco a pouco transformando o que não atende ao nosso desejo em elementos de aprendizado sobre o que não fazer, o que evitar. Assim o erro adquire uma característica educativa, e se torna um grande aliado. Conhecer nossas mazelas nos fortalece para criar novas propostas de como nos conduzirmos na vida.
Profetizar nao é expressar determinismos, mas é apontar possibilidades, e se elas são negativas, o que temos a fazer é urgentemente empreender uma proposta de superação, de novas realizações. Por exemplo, se eu como desmesuradamente, se fumo, se bebo excessivamente, posso profetizar um futuro amargo em termos de saúde física, então, em vez de resignação, o que se pede é uma mudança radical no proceder com meu corpo.
Não é tarefa simples nem de alcance imediato, mas ser profeta de si mesmo talvez seja a grande tarefa de nós para conosco.
martedì 26 marzo 2013
lunedì 25 marzo 2013
Guru, o dissipador de trevas ?
Assistindo alguns vídeos do Grupo Rama, associação que tem como meta a preparação para uma nova etapa de vida humana, encontrei em alguma fala a expressão acima, "guru, o dissipador de trevas", não como defesa da literalidade da frase, mas como uma crítica àqueles que esperam alguém que os guie para a iluminação.
Gurus, guias, mentores, ãao sempre importantes nas nossas vidas, desde que fiquem no seu papel de iluminadores de caminhos, que apontem possibilidades, que nos acompanhem na caminhada, mas sem fazer por nós o que nos cabe e sem nos poupar de nossas próprias escolhas equivocadas.
Como Krishnamurthy pregava a iluminação como um caminho pessoal e intransferível, eu também penso que a tarefa não pode ser partilhada; porém, se para alguns espiritualistas, a busca deve ser solitária eu penso que as muletas são necessárias até um certo ponto, até o momento em que já possamos seguir em frente com um conhecimento próprio e domínio da expressão do nosso próprio eu em consonância com o Eu Superior. Até lá, me desculpem os grandes pensadores espiritualistas que atribuem à pessoa a construção solitária do próprio caminho, independente de outras fontes de informação, mas penso que um guru, um guia, um mentor, é uma muleta inicial, uma verdade provisória que auxilie a dar os primeiros passos. Como uma criança que para se erguer se apóia nos móveis, nas pernas e nas mãos dos adultos. Depois, por si só, caminha segura definindo o próprio alvo.
A atitude correta, penso eu, é a de ouvir os mestres, considerar seus ensinamentos, mas no momento da judicação, da consideração da pertinência de suas palavras, abalizar as informações com nossas próprias experiências e ouvir a voz interna que nos faculta agregá-las ou não ao nosso proceder.
Percebo bem isso ao analisar meus percursos profissional e pessoal, em ambos tendo eu, em várias etapas da vida, a interferência de outras consciências em minhas escolhas e na constituição da manifestação do meu eu inferior, com minha anuência consciente dentro do espectro de lucidez que eu tinha no momento. Após tais influências densas cessarem e serem substituídas por outras, então mais fluidas, percebo que no transcorrer da vida no tempo, alguma liberdade mais ampla foi se manifestando, como alguém que tendo os movimentos comprometidos, esteve engessado, depois caminhou com muletas, e que ao final, bastaria uma mão segura que acompanhasse os passos. Visualizo para o meu futuro, um caminhar pessoal e livre, com pessoas para partilhar as experiências, mas não para realizar por mim a tarefa intransferível de autoiluminação.
Tenho em mente duas personagem sobre o entendimento da tarefa do guru.
A primeira é a Palas Athena da Odisséia de Homero, encaminhando Telêmaco para a vida, sem dizer o que fazer, mas sugerindo possibilidades, incutindo a fé em si mesmo e a força e a coragem de arrostar as dificuldades, a transcender a condição atual de dependência e limitação de horizontes, para a expansão da expressão do eu como alguém potente e inovador no próprio caminho.
A segunda coisa que me vem à mente, é o novo Papa, Francesco. Não sendo católica, a influência do Papa Bergoglio sobre mim não é fundamental, mas, tendo em consideração a quantidade de fiéis da Igreja Católica no planeta, vejo como importante a figura de um líder religioso que ofereça um novo paradigma de atuação e prática cristã para o homem contemporâneo. O gesto, a demonstração dos ideais dos quais é imbuído, valem mais do que discursos, ainda que sejam considerados importantes manifestos públicos de intenções e políticas. Apresentar uma conduta cristã que reforce a mensagem do Cristo: simplicidade, alegria, confiança, esperança e solidariedade.
Gurus, guias, mentores, são assim, pessoas que na sua forma de viver nos oferecem alternativas para repensarmos a condução de nossas vidas, sem que devamos segui-los cegamente ou reproduzirmos suas formas e maneiras de se posicionarem frente a vida. Essas figuras espiritualizadas que nos inspiram, deixam à todos estupefatos, justamente porque agem de maneira mais adequada às leis universais de solidariedade, de auxílio discreto, de felicidade interior. Fazem o que deveria ser normal, e, num mundo de desequilíbrios e desvios práticos dos ideais de Bem, Verdade, Justiça e Virtudes, são interpretados como excepcionais quando deveriam ser a regra.
Gurus, sao dissipadores de trevas? Sim e não. Sim porque iluminam veredas e nos fazem perceber que há algo de muito simples a ser feito e que nos parecia inexequível a um primeiro olhar. Mas não serão dissipadores de trevas se não estabelecermos uma mínima condição de intersubjetividade, ou seja, de comunicação em que algo que eles manifestem cale dentro de nós.
Sem gurus, muitos de nós não teríamos sequer vislumbrado uma nova forma de interpretar, de conceber a vida humana, e, com certeza, não devem ser endeusados nem cegamente seguidos, mas considerados na sua divina tarefa de nos reconectar conosco mesmos para a nossa própria autoiluminação.
Gurus, guias, mentores, ãao sempre importantes nas nossas vidas, desde que fiquem no seu papel de iluminadores de caminhos, que apontem possibilidades, que nos acompanhem na caminhada, mas sem fazer por nós o que nos cabe e sem nos poupar de nossas próprias escolhas equivocadas.
Como Krishnamurthy pregava a iluminação como um caminho pessoal e intransferível, eu também penso que a tarefa não pode ser partilhada; porém, se para alguns espiritualistas, a busca deve ser solitária eu penso que as muletas são necessárias até um certo ponto, até o momento em que já possamos seguir em frente com um conhecimento próprio e domínio da expressão do nosso próprio eu em consonância com o Eu Superior. Até lá, me desculpem os grandes pensadores espiritualistas que atribuem à pessoa a construção solitária do próprio caminho, independente de outras fontes de informação, mas penso que um guru, um guia, um mentor, é uma muleta inicial, uma verdade provisória que auxilie a dar os primeiros passos. Como uma criança que para se erguer se apóia nos móveis, nas pernas e nas mãos dos adultos. Depois, por si só, caminha segura definindo o próprio alvo.
A atitude correta, penso eu, é a de ouvir os mestres, considerar seus ensinamentos, mas no momento da judicação, da consideração da pertinência de suas palavras, abalizar as informações com nossas próprias experiências e ouvir a voz interna que nos faculta agregá-las ou não ao nosso proceder.
Percebo bem isso ao analisar meus percursos profissional e pessoal, em ambos tendo eu, em várias etapas da vida, a interferência de outras consciências em minhas escolhas e na constituição da manifestação do meu eu inferior, com minha anuência consciente dentro do espectro de lucidez que eu tinha no momento. Após tais influências densas cessarem e serem substituídas por outras, então mais fluidas, percebo que no transcorrer da vida no tempo, alguma liberdade mais ampla foi se manifestando, como alguém que tendo os movimentos comprometidos, esteve engessado, depois caminhou com muletas, e que ao final, bastaria uma mão segura que acompanhasse os passos. Visualizo para o meu futuro, um caminhar pessoal e livre, com pessoas para partilhar as experiências, mas não para realizar por mim a tarefa intransferível de autoiluminação.
Tenho em mente duas personagem sobre o entendimento da tarefa do guru.
A primeira é a Palas Athena da Odisséia de Homero, encaminhando Telêmaco para a vida, sem dizer o que fazer, mas sugerindo possibilidades, incutindo a fé em si mesmo e a força e a coragem de arrostar as dificuldades, a transcender a condição atual de dependência e limitação de horizontes, para a expansão da expressão do eu como alguém potente e inovador no próprio caminho.
A segunda coisa que me vem à mente, é o novo Papa, Francesco. Não sendo católica, a influência do Papa Bergoglio sobre mim não é fundamental, mas, tendo em consideração a quantidade de fiéis da Igreja Católica no planeta, vejo como importante a figura de um líder religioso que ofereça um novo paradigma de atuação e prática cristã para o homem contemporâneo. O gesto, a demonstração dos ideais dos quais é imbuído, valem mais do que discursos, ainda que sejam considerados importantes manifestos públicos de intenções e políticas. Apresentar uma conduta cristã que reforce a mensagem do Cristo: simplicidade, alegria, confiança, esperança e solidariedade.
Gurus, guias, mentores, são assim, pessoas que na sua forma de viver nos oferecem alternativas para repensarmos a condução de nossas vidas, sem que devamos segui-los cegamente ou reproduzirmos suas formas e maneiras de se posicionarem frente a vida. Essas figuras espiritualizadas que nos inspiram, deixam à todos estupefatos, justamente porque agem de maneira mais adequada às leis universais de solidariedade, de auxílio discreto, de felicidade interior. Fazem o que deveria ser normal, e, num mundo de desequilíbrios e desvios práticos dos ideais de Bem, Verdade, Justiça e Virtudes, são interpretados como excepcionais quando deveriam ser a regra.
Gurus, sao dissipadores de trevas? Sim e não. Sim porque iluminam veredas e nos fazem perceber que há algo de muito simples a ser feito e que nos parecia inexequível a um primeiro olhar. Mas não serão dissipadores de trevas se não estabelecermos uma mínima condição de intersubjetividade, ou seja, de comunicação em que algo que eles manifestem cale dentro de nós.
Sem gurus, muitos de nós não teríamos sequer vislumbrado uma nova forma de interpretar, de conceber a vida humana, e, com certeza, não devem ser endeusados nem cegamente seguidos, mas considerados na sua divina tarefa de nos reconectar conosco mesmos para a nossa própria autoiluminação.
giovedì 21 marzo 2013
Maranatha
Nunca li a Bíblia por inteiro. Quando adolescente iniciei em Gênesis e parei em Jó. Ainda no Antigo Testamento me encantei com os Salmos. Do Novo Testamento li Matheus por várias vezes ao longo da vida.
Mas agora, que não trabalho mais fora de casa e tenho mais tempo livre, reiniciei o Novo Testamento, lendo todos os evangelistas, Matheus, Marcos, Lucas e João, bem como os Atos dos Apóstolos e agora, finalizei as epístolas dos Atos dos Apóstolos.
Não leio como livro de revelações ou como palavra absoluta de Deus. Leio com o senso crítico histórico, considerando os autores em sua humanidade e em sua interexistencialidade com as várias dimensões e suas experiências com a espiritualidade. Creio que as interpretações dos autores são limitadas pela condição humana e pelas monoideias dos habitantes astrais com os quais tinham contato. Creio também que eu, como leitora, também interpreto o que tenho em mãos segundo as ideias que considero verdadeiras até o momento, tendo também minha leitura se modificado ao longo da vida.
Fui católica até os dezoito anos, batizada, crismada e tive até intenções de entrar para a Ordem Canossiana, mas por um apelo à vida material, por razões de discordância com os dogmas religiosos e, por iniciar leituras espiritualistas que respondiam melhor às minhas dúvidas e explicavam melhor fenômenos comuns na espiritualidade familiar, abandonei a Igreja Católica, mesmo a respeitando e trabalhando para instituições católicas por toda a vida, onde ainda mantenho muitos amigos fiéis.
Sempre tive uma grande admiração pela figura de Saulo de Tarso, abordado por Jesus, segundo ele, na estrada para Damasco. O encontro dele com o Mestre é de uma beleza indescritível, só quem já teve a sensação da presença escandalosa de Deus em sua vida (expressão de meu amigo João Vieira), pode dimensionar o impacto de tal encontro. O agora apóstolo Paulo de Tarso é a demonstração viva da transformação que uma experiência interexistencial promove no projeto de vida pessoal. Assim ninguém é mais o mesmo depois de uma viagem astral consciente (fala de Saulo Calderon), de visualizar uma materialização espiritual, de um contato com um extra-terrestre, e por aí vai. Assim ocorreu comigo quando mudei minha concepção de religiosidade, evidentemente que sem a radicalidade paulina. Muitas experiências espirituais e interexistenciais em minha vida também marcaram profundamente minha forma de ver, de sentir e de interpretar o mundo, sabendo eu que não tenho grandes e absolutas verdades mas apenas aquelas adstritas ao horizonte do meu conhecimento proveniente do reconhecimento dos meus erros e acertos, bem como de informações que logicamente vou concatenando e comparando com a experiência empírica racionalizada.
O problema que existia quando era católica e permanece agora, trinta anos depois, ainda é a distância entre minha compreensão e minha prática diária de vida, meu comportamento para comigo e para com os outros. Há um abismo que separa as minhas concepções sempre renovadas e a minha conduta em muito repetitiva.
Encontro auxílio em práticas diversas encontradas aqui e ali, o Evangelho no Lar aprendido no Espiritismo, a leitura da Bíblia do Catolicismo, a prática da meditação no Cristianismo Primitivo, a consciência das energias com a Projeciologia, a leitura constante de tudo que me instrumentalize para o autoconhecimento e a exploração da minha realidade interexistencial. Vale tudo para a gente se conectar com o universo, para estar mais perto da realidade multidimensional. Mal conhecemos o corpo físico e seu funcionamento, mal nos relacionamos em paz com nossos parceiros de vida, que dirá reconhecer os vários corpos e a penetração da mente em várias dimensões diversas e simultaneamente. Nosso cérebro não comporta tanto conhecimento, não registra as experiências fora do corpo físico de maneira clara e nossa capacidade de consciência geral é muito limitada.
O que se pode fazer é realizar práticas que nos habilitem pouco a pouco ao crescimento espiritual.
Lendo os Atos dos Apóstolos, encontrei uma citação de Paulo que se refere ao maranatha, o "vinde a mim Senhor", o mesmo mantra que aprendi com Laurence Freeman em um retiro espiritual na cidade de Vinhedo, em São Paulo.
O ma-ra-na-tha, praticado no silêncio interior do coração, me dá alguma paz e me faz conciliar a ideia de universalidade com a minha perspectiva particular de espiritualidade.
Quando pronuncio o mantra ma-ra-na-tha, penso na multiplicidade dos Senhores, quer seja Jesus, Krishna, Buda, Alá, Jeová, Deus... que para mim são representações do Bem, da Verdade, da Paz, do equilíbrio das energias em comunhão para o desenvolvimento de todos os seres dos universos, é a minha busca em participar da construção de uma inimaginável egrégora do Bem.
Naquele momento da meditação, é como se a frase que Paulo expressa em alguma das Epístolas, "não sou mais eu que vivo, mas é o Cristo que vive em mim", se realizasse por algum átimo no meu imo; quando a união em divindade é tal que se é numa situação atemporal e alocal.
Maranatha, vinde a mim Senhor, é buscar realizar a centelha divina dentro da vida de um eu inferior que deseja se realizar num Eu superior; é o fortalecer da tentativa de aproximar meu pensar do meu existir.
Mas agora, que não trabalho mais fora de casa e tenho mais tempo livre, reiniciei o Novo Testamento, lendo todos os evangelistas, Matheus, Marcos, Lucas e João, bem como os Atos dos Apóstolos e agora, finalizei as epístolas dos Atos dos Apóstolos.
Não leio como livro de revelações ou como palavra absoluta de Deus. Leio com o senso crítico histórico, considerando os autores em sua humanidade e em sua interexistencialidade com as várias dimensões e suas experiências com a espiritualidade. Creio que as interpretações dos autores são limitadas pela condição humana e pelas monoideias dos habitantes astrais com os quais tinham contato. Creio também que eu, como leitora, também interpreto o que tenho em mãos segundo as ideias que considero verdadeiras até o momento, tendo também minha leitura se modificado ao longo da vida.
Fui católica até os dezoito anos, batizada, crismada e tive até intenções de entrar para a Ordem Canossiana, mas por um apelo à vida material, por razões de discordância com os dogmas religiosos e, por iniciar leituras espiritualistas que respondiam melhor às minhas dúvidas e explicavam melhor fenômenos comuns na espiritualidade familiar, abandonei a Igreja Católica, mesmo a respeitando e trabalhando para instituições católicas por toda a vida, onde ainda mantenho muitos amigos fiéis.
Sempre tive uma grande admiração pela figura de Saulo de Tarso, abordado por Jesus, segundo ele, na estrada para Damasco. O encontro dele com o Mestre é de uma beleza indescritível, só quem já teve a sensação da presença escandalosa de Deus em sua vida (expressão de meu amigo João Vieira), pode dimensionar o impacto de tal encontro. O agora apóstolo Paulo de Tarso é a demonstração viva da transformação que uma experiência interexistencial promove no projeto de vida pessoal. Assim ninguém é mais o mesmo depois de uma viagem astral consciente (fala de Saulo Calderon), de visualizar uma materialização espiritual, de um contato com um extra-terrestre, e por aí vai. Assim ocorreu comigo quando mudei minha concepção de religiosidade, evidentemente que sem a radicalidade paulina. Muitas experiências espirituais e interexistenciais em minha vida também marcaram profundamente minha forma de ver, de sentir e de interpretar o mundo, sabendo eu que não tenho grandes e absolutas verdades mas apenas aquelas adstritas ao horizonte do meu conhecimento proveniente do reconhecimento dos meus erros e acertos, bem como de informações que logicamente vou concatenando e comparando com a experiência empírica racionalizada.
O problema que existia quando era católica e permanece agora, trinta anos depois, ainda é a distância entre minha compreensão e minha prática diária de vida, meu comportamento para comigo e para com os outros. Há um abismo que separa as minhas concepções sempre renovadas e a minha conduta em muito repetitiva.
Encontro auxílio em práticas diversas encontradas aqui e ali, o Evangelho no Lar aprendido no Espiritismo, a leitura da Bíblia do Catolicismo, a prática da meditação no Cristianismo Primitivo, a consciência das energias com a Projeciologia, a leitura constante de tudo que me instrumentalize para o autoconhecimento e a exploração da minha realidade interexistencial. Vale tudo para a gente se conectar com o universo, para estar mais perto da realidade multidimensional. Mal conhecemos o corpo físico e seu funcionamento, mal nos relacionamos em paz com nossos parceiros de vida, que dirá reconhecer os vários corpos e a penetração da mente em várias dimensões diversas e simultaneamente. Nosso cérebro não comporta tanto conhecimento, não registra as experiências fora do corpo físico de maneira clara e nossa capacidade de consciência geral é muito limitada.
O que se pode fazer é realizar práticas que nos habilitem pouco a pouco ao crescimento espiritual.
Lendo os Atos dos Apóstolos, encontrei uma citação de Paulo que se refere ao maranatha, o "vinde a mim Senhor", o mesmo mantra que aprendi com Laurence Freeman em um retiro espiritual na cidade de Vinhedo, em São Paulo.
O ma-ra-na-tha, praticado no silêncio interior do coração, me dá alguma paz e me faz conciliar a ideia de universalidade com a minha perspectiva particular de espiritualidade.
Quando pronuncio o mantra ma-ra-na-tha, penso na multiplicidade dos Senhores, quer seja Jesus, Krishna, Buda, Alá, Jeová, Deus... que para mim são representações do Bem, da Verdade, da Paz, do equilíbrio das energias em comunhão para o desenvolvimento de todos os seres dos universos, é a minha busca em participar da construção de uma inimaginável egrégora do Bem.
Naquele momento da meditação, é como se a frase que Paulo expressa em alguma das Epístolas, "não sou mais eu que vivo, mas é o Cristo que vive em mim", se realizasse por algum átimo no meu imo; quando a união em divindade é tal que se é numa situação atemporal e alocal.
Maranatha, vinde a mim Senhor, é buscar realizar a centelha divina dentro da vida de um eu inferior que deseja se realizar num Eu superior; é o fortalecer da tentativa de aproximar meu pensar do meu existir.
domenica 3 marzo 2013
Inefável é a Verdade
A verdade das coisas é incomunicável, é inefável, uma ideia proferida por Carlo Dorofatti, não me lembro se exatamente assim, mas com esse sentido.
A gente pode se esforçar imensamente e, como num processo de alethea, ir des-velando a Verdade. De um ponto de vista metafísico existe uma Verdade única, universal e pré-existente à nossa experiência pessoal. De um ponto de vista relativista existem inúmeras verdades constituídas pelos sujeitos que as elaboram, as experienciam. Mas ambas possuem a barreira intransponível da comunicação. Claramente impossível dizer exatamente aquilo que se considera a Verdade ou cada uma das verdades.
Muito difícil saber qual o significado que um indivíduo atribui a um conceito, tanto daquele que o constrói com consciência como daquele que o faz por impulso da forma de conhecer própria da espécie humana.
Um dos grandes problemas humanos é exatamente a linguagem, as dificuldades que temos cotidianamente de expressarmos a outrem o que sentimos e o que pensamos. Sempre o empecilho de que aquilo que proferimos com o sentido que empregamos dificilmente é entendido tal e qual pensamos. Em geral a outra pessoa entende o que dizemos mediante os conceitos construídos e albergados por ela e que muitas vezes não coincidem com os nossos.
É um tema complicado pra gente pensar e partilhar é o da morte. As crenças pessoais e grupais constituídas como verdades não nos permitem acessar o fenômeno da morte de maneira isenta. Toda visão, toda concepção é o meio de interpretação do fenômeno.
Minha avó materna, Cici, despediu-se dos corpos físicos, densos, e agora habita uma região diferente da nossa, em uma dimensão inacessível ainda para a tecnologia de nossos corpos. E mesmo que alguém a acesse e permita a comunicação, seja por meio da mediunidade psicofônica, da psicografia, da clarividência, da projeção astral ou da TCI (transcomunicação instrumental por meio de áudios, fotografias e imagens em movimento, via computador, rádio, tv, telefone), ainda assim a interpretação que faremos das informações será passada pelo filtro, pelos óculos da nossa cosmovisão, particular e ao mesmo tempo partilhada num grupo, seja de cunho religioso, exotérico ou científico.
Tenho observado o fenômeno da morte e suas consequências nos comportamentos dos familiares e amigos. As famílias expressam os paradigmas pelos quais conduzem suas vidas de maneira veemente quando um parente ou alguém próximo morre, dessoma, desencarna.
Há os desesperados em sua tristeza que se sentem revoltados, abandonados, desrespeitados e injustiçados; há os de uma discreta tristeza que se portam tranquilos, solidários, esperançosos e compreensivos. De um grupo ao outro há uma infinita gama de variações, mas em geral, é essa a classificação que faço por observação.
Tanto num grupo como no outro há de fundo uma concepção de sentido da vida humana nesse mundo, há uma maneira de vivenciar as emoções e os vínculos afetivos. De qualquer maneira, ao conversar individualmente com os participantes de ambos os grupos, cada um tem, dentro de um paradigma geral, sua visão particular, sua compreensão do fenômeno, sua explicação para o que sucedeu e sucederá ao "morto".
Não creio que alguém possua a resposta melhor, mais adequada porque cada um constrói e acessa um nível de informações, por meios muito diferentes e com orientações muito divergentes. No final, parece que mesmo com algum acompanhamento, o caminho é solitário, a busca é pessoal e a verdade que vamos constituindo é algo que vige entre o interior e o exterior. Nossa tentativa é de organizar tudo dentro de nós para atribuirmos senso à vida e ao mundo, às nossas relações ditosas ou amargas com as pessoas, mas é sempre um exercício muito particular.
O que me parece é que na busca incessante, mais panoramas vão sendo descortinados e apresentados horizontes mais amplos; enquanto aquele indivíduo que não questiona, não se empenha numa reflexão séria e continuada, fica atado a uma concepção que não o liberta, não o acalenta, não o impulsiona para novas qualidades em suas relações e ideias.
Pessoa alguma, ao meu ver, dentro do meu espectro de conhecimento, tem uma verdade acabada que me sirva, mas ao longo da vida, no evolver das concepções que albergo, vejo mais sentido em coisas nas quais creio hoje e que ontem ignorava.
Penso que se existe a Verdade, ela não será dita mas vivida, será um estado e não um discurso. Para mim as verdades são os discursos explicadores e divulgadores das nossas concepções e de nossos grupos, são proferidos e nós tentamos aplicá-los como guias de nossas ações e das ações alheias.
Talvez a observação faça mais pelo vislumbre da Verdade do que inúmeros discursos de verdades.
Enfim, falamos demais e vivemos de menos. Nossas vidas se restringem aos nossos discursos incompreensíveis e incompreendidos, e assim impedimos que a Verdade inefável se manifeste enquanto essência da Vida.
A morte é um tema especial para pensar a inefabilidade da Verdade, já que cada um se aproxima dela segundo as concepções de suas vivências e ninguém pode ser assertivo quanto à uma explicação cabal. Mas é inegável também que é um tema importante para abrir espaço para rever velhas crenças e forjar novas concepções que nos façam sentir mais próximos de um sentido universal.
A morte da Cici foi uma grande oportunidade para todos exercitarmos comportamentos segundo nossas crenças e observarmos os comportamentos alheios. Com certeza, a morte da Cici fez todos se perguntarem sobre a Verdade do sentido da vida.
A gente pode se esforçar imensamente e, como num processo de alethea, ir des-velando a Verdade. De um ponto de vista metafísico existe uma Verdade única, universal e pré-existente à nossa experiência pessoal. De um ponto de vista relativista existem inúmeras verdades constituídas pelos sujeitos que as elaboram, as experienciam. Mas ambas possuem a barreira intransponível da comunicação. Claramente impossível dizer exatamente aquilo que se considera a Verdade ou cada uma das verdades.
Muito difícil saber qual o significado que um indivíduo atribui a um conceito, tanto daquele que o constrói com consciência como daquele que o faz por impulso da forma de conhecer própria da espécie humana.
Um dos grandes problemas humanos é exatamente a linguagem, as dificuldades que temos cotidianamente de expressarmos a outrem o que sentimos e o que pensamos. Sempre o empecilho de que aquilo que proferimos com o sentido que empregamos dificilmente é entendido tal e qual pensamos. Em geral a outra pessoa entende o que dizemos mediante os conceitos construídos e albergados por ela e que muitas vezes não coincidem com os nossos.
É um tema complicado pra gente pensar e partilhar é o da morte. As crenças pessoais e grupais constituídas como verdades não nos permitem acessar o fenômeno da morte de maneira isenta. Toda visão, toda concepção é o meio de interpretação do fenômeno.
Minha avó materna, Cici, despediu-se dos corpos físicos, densos, e agora habita uma região diferente da nossa, em uma dimensão inacessível ainda para a tecnologia de nossos corpos. E mesmo que alguém a acesse e permita a comunicação, seja por meio da mediunidade psicofônica, da psicografia, da clarividência, da projeção astral ou da TCI (transcomunicação instrumental por meio de áudios, fotografias e imagens em movimento, via computador, rádio, tv, telefone), ainda assim a interpretação que faremos das informações será passada pelo filtro, pelos óculos da nossa cosmovisão, particular e ao mesmo tempo partilhada num grupo, seja de cunho religioso, exotérico ou científico.
Tenho observado o fenômeno da morte e suas consequências nos comportamentos dos familiares e amigos. As famílias expressam os paradigmas pelos quais conduzem suas vidas de maneira veemente quando um parente ou alguém próximo morre, dessoma, desencarna.
Há os desesperados em sua tristeza que se sentem revoltados, abandonados, desrespeitados e injustiçados; há os de uma discreta tristeza que se portam tranquilos, solidários, esperançosos e compreensivos. De um grupo ao outro há uma infinita gama de variações, mas em geral, é essa a classificação que faço por observação.
Tanto num grupo como no outro há de fundo uma concepção de sentido da vida humana nesse mundo, há uma maneira de vivenciar as emoções e os vínculos afetivos. De qualquer maneira, ao conversar individualmente com os participantes de ambos os grupos, cada um tem, dentro de um paradigma geral, sua visão particular, sua compreensão do fenômeno, sua explicação para o que sucedeu e sucederá ao "morto".
Não creio que alguém possua a resposta melhor, mais adequada porque cada um constrói e acessa um nível de informações, por meios muito diferentes e com orientações muito divergentes. No final, parece que mesmo com algum acompanhamento, o caminho é solitário, a busca é pessoal e a verdade que vamos constituindo é algo que vige entre o interior e o exterior. Nossa tentativa é de organizar tudo dentro de nós para atribuirmos senso à vida e ao mundo, às nossas relações ditosas ou amargas com as pessoas, mas é sempre um exercício muito particular.
O que me parece é que na busca incessante, mais panoramas vão sendo descortinados e apresentados horizontes mais amplos; enquanto aquele indivíduo que não questiona, não se empenha numa reflexão séria e continuada, fica atado a uma concepção que não o liberta, não o acalenta, não o impulsiona para novas qualidades em suas relações e ideias.
Pessoa alguma, ao meu ver, dentro do meu espectro de conhecimento, tem uma verdade acabada que me sirva, mas ao longo da vida, no evolver das concepções que albergo, vejo mais sentido em coisas nas quais creio hoje e que ontem ignorava.
Penso que se existe a Verdade, ela não será dita mas vivida, será um estado e não um discurso. Para mim as verdades são os discursos explicadores e divulgadores das nossas concepções e de nossos grupos, são proferidos e nós tentamos aplicá-los como guias de nossas ações e das ações alheias.
Talvez a observação faça mais pelo vislumbre da Verdade do que inúmeros discursos de verdades.
Enfim, falamos demais e vivemos de menos. Nossas vidas se restringem aos nossos discursos incompreensíveis e incompreendidos, e assim impedimos que a Verdade inefável se manifeste enquanto essência da Vida.
A morte é um tema especial para pensar a inefabilidade da Verdade, já que cada um se aproxima dela segundo as concepções de suas vivências e ninguém pode ser assertivo quanto à uma explicação cabal. Mas é inegável também que é um tema importante para abrir espaço para rever velhas crenças e forjar novas concepções que nos façam sentir mais próximos de um sentido universal.
A morte da Cici foi uma grande oportunidade para todos exercitarmos comportamentos segundo nossas crenças e observarmos os comportamentos alheios. Com certeza, a morte da Cici fez todos se perguntarem sobre a Verdade do sentido da vida.
venerdì 1 marzo 2013
Eleições e democracia
A Itália acabou de passar pelo processo de eleições gerais em exercício de democracia.
Uma confusão danada se estabeleceu após os resultados, o que também já ocorreu várias vezes no Brasil, em virtude de não haver maioria do legislativo da mesma linha política do executivo. Uma aparente ingovernabilidade.
Pra mim a democracia é justamente isso, todos diferentes e juntos para pensarem, planejarem e agirem sobre qualquer situação, seja religiosa, política, educacional, social, cultural, sei lá, qualquer coisa que importe para cada um dos cidadãos.
Eu tenho muito claro pra mim que democracia tem que ser vista segundo a concepção de John Dewey, de que democracia é questão de vivência diária com base biológica e inteligente, é alguma coisa que não se restringe ao exercício profissional da política.
Estou pensando no que acontece ali no horto do meu companheiro, ou no seu jardim. Cada forma de vida, seja animal, mineral ou vegetal, em confronto entre elas e com a ação humana. Há um equilíbrio de sobrevivência entre espécies diferentes que se atritam e daí criam um ecossistema funcional. Há uma inteligência instintiva que direciona o comportamento adaptativo de cada espécie ao contato com as demais e a inteligência consciente do horticultor que interfere diretamente nesse processo.
No geral se vê que é um embate de seres diferentes que devem viver em intenso contato e luta pela sobrevivência, alguns perdem mais e outros ganham mais, mas no geral todos vão em frente.
E eu vejo que é algo muito parecido nas sociedades humanas. Democracia é todos juntos focalizando um determinando problema e procurando uma solução comum que favoreça à todos com mínimos danos. Muitos grupos de visões diferentes se empenham na busca do poder para organizar as instituições econômicas, políticas, culturais, educacionais e sociais em geral, segundo seus propósitos e cosmovisões. Só que na democracia o grupo que alcança o poder não o fará de forma ditatorial e impositiva, mas terá que estabelecer alianças, acordos e fazer concessões, para articular com os interesses dos outros grupos também partilhantes do governo. O que é visto como perigo de ingovernabilidade eu vejo como oportunidade de se escutar vozes discordantes que forçarão a mudança de comportamentos usuais, desde que as novas caras do legislativo não se corrompam.
No caso específico que citei no início do texto, a eleição italiana de fevereiro de 2013, há quase um empate entre a esquerda e da direita e a emergência importante de um movimento, o Cinco Stelle, liderado por um cômico que foi, em dois anos, ocupando o espaço de praças públicas e via internet, agregando um número impressionante de cidadãos inconformados com a maneira tradicional de fazer política.
A primeira crítica é do movimento ser liderado por um cômico que não é político. Quer dizer, não é político do ponto de vista profissional, mas, como todo cidadão, ele é politico no sentido de que é alguém participante da sociedade e que tem todo o direito de se manifestar e exigir que os ditos políticos profissionais se comportem em prol do bem geral da sociedade, e não apenas segundo os interesses particulares de grupos econômicos e políticos.
Jean Jacques Rousseau ja discutia isso no Contrato Social e no Discurso sobre a Origem e o Fundamento da Desigualdade entre os Homens. O importante é buscar o bem de todos e não o bem particular. O bem geral está ligado às coisas fundamentais para as vidas humanas e o bem particular relacionado aos interesses supérfluos de determinados grupos. Então, as pessoas em geral precisam se alimentar, se abrigar, criar produtiva e culturalmente, procriar, cuidar da saúde, conviver solidariamente etc. Para isso é necessário um exercício político que ouça todos e direcione as arrecadações fiscais para prioritariamente garantir os direitos naturais e sociais de todos e de cada um. Mas ter muitos imóveis, se alimentar desmesuradamente, usufruir da cultura enquanto privilégio, educar seus filhos de maneira especial e segregacionista, só pode ser conquistado negando direitos, explorando o trabalho formal e o informal e direcionando verbas públicas para desejos particulares.
Então, modificar comportamentos pessoais no exercício profissional da política será fundamental para criar uma nova sociedade construída em bases democráticas. e isso dependerá de se rever as bases de nossos pensamentos e ações, em que medida pensamos primeiro em nós e no nosso grupo e em que medida nossas escolhas atingem o geral da sociedade. Para isso todos têm que se manifestar, seja nas praças e nas infovias ou nas comunicações com o poder público, mas principalmente nas eleições, de maneira consciente e exigente.
Uma confusão danada se estabeleceu após os resultados, o que também já ocorreu várias vezes no Brasil, em virtude de não haver maioria do legislativo da mesma linha política do executivo. Uma aparente ingovernabilidade.
Pra mim a democracia é justamente isso, todos diferentes e juntos para pensarem, planejarem e agirem sobre qualquer situação, seja religiosa, política, educacional, social, cultural, sei lá, qualquer coisa que importe para cada um dos cidadãos.
Eu tenho muito claro pra mim que democracia tem que ser vista segundo a concepção de John Dewey, de que democracia é questão de vivência diária com base biológica e inteligente, é alguma coisa que não se restringe ao exercício profissional da política.
Estou pensando no que acontece ali no horto do meu companheiro, ou no seu jardim. Cada forma de vida, seja animal, mineral ou vegetal, em confronto entre elas e com a ação humana. Há um equilíbrio de sobrevivência entre espécies diferentes que se atritam e daí criam um ecossistema funcional. Há uma inteligência instintiva que direciona o comportamento adaptativo de cada espécie ao contato com as demais e a inteligência consciente do horticultor que interfere diretamente nesse processo.
No geral se vê que é um embate de seres diferentes que devem viver em intenso contato e luta pela sobrevivência, alguns perdem mais e outros ganham mais, mas no geral todos vão em frente.
E eu vejo que é algo muito parecido nas sociedades humanas. Democracia é todos juntos focalizando um determinando problema e procurando uma solução comum que favoreça à todos com mínimos danos. Muitos grupos de visões diferentes se empenham na busca do poder para organizar as instituições econômicas, políticas, culturais, educacionais e sociais em geral, segundo seus propósitos e cosmovisões. Só que na democracia o grupo que alcança o poder não o fará de forma ditatorial e impositiva, mas terá que estabelecer alianças, acordos e fazer concessões, para articular com os interesses dos outros grupos também partilhantes do governo. O que é visto como perigo de ingovernabilidade eu vejo como oportunidade de se escutar vozes discordantes que forçarão a mudança de comportamentos usuais, desde que as novas caras do legislativo não se corrompam.
No caso específico que citei no início do texto, a eleição italiana de fevereiro de 2013, há quase um empate entre a esquerda e da direita e a emergência importante de um movimento, o Cinco Stelle, liderado por um cômico que foi, em dois anos, ocupando o espaço de praças públicas e via internet, agregando um número impressionante de cidadãos inconformados com a maneira tradicional de fazer política.
A primeira crítica é do movimento ser liderado por um cômico que não é político. Quer dizer, não é político do ponto de vista profissional, mas, como todo cidadão, ele é politico no sentido de que é alguém participante da sociedade e que tem todo o direito de se manifestar e exigir que os ditos políticos profissionais se comportem em prol do bem geral da sociedade, e não apenas segundo os interesses particulares de grupos econômicos e políticos.
Jean Jacques Rousseau ja discutia isso no Contrato Social e no Discurso sobre a Origem e o Fundamento da Desigualdade entre os Homens. O importante é buscar o bem de todos e não o bem particular. O bem geral está ligado às coisas fundamentais para as vidas humanas e o bem particular relacionado aos interesses supérfluos de determinados grupos. Então, as pessoas em geral precisam se alimentar, se abrigar, criar produtiva e culturalmente, procriar, cuidar da saúde, conviver solidariamente etc. Para isso é necessário um exercício político que ouça todos e direcione as arrecadações fiscais para prioritariamente garantir os direitos naturais e sociais de todos e de cada um. Mas ter muitos imóveis, se alimentar desmesuradamente, usufruir da cultura enquanto privilégio, educar seus filhos de maneira especial e segregacionista, só pode ser conquistado negando direitos, explorando o trabalho formal e o informal e direcionando verbas públicas para desejos particulares.
Então, modificar comportamentos pessoais no exercício profissional da política será fundamental para criar uma nova sociedade construída em bases democráticas. e isso dependerá de se rever as bases de nossos pensamentos e ações, em que medida pensamos primeiro em nós e no nosso grupo e em que medida nossas escolhas atingem o geral da sociedade. Para isso todos têm que se manifestar, seja nas praças e nas infovias ou nas comunicações com o poder público, mas principalmente nas eleições, de maneira consciente e exigente.
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