Assistindo alguns vídeos do Grupo Rama, associação que tem como meta a preparação para uma nova etapa de vida humana, encontrei em alguma fala a expressão acima, "guru, o dissipador de trevas", não como defesa da literalidade da frase, mas como uma crítica àqueles que esperam alguém que os guie para a iluminação.
Gurus, guias, mentores, ãao sempre importantes nas nossas vidas, desde que fiquem no seu papel de iluminadores de caminhos, que apontem possibilidades, que nos acompanhem na caminhada, mas sem fazer por nós o que nos cabe e sem nos poupar de nossas próprias escolhas equivocadas.
Como Krishnamurthy pregava a iluminação como um caminho pessoal e intransferível, eu também penso que a tarefa não pode ser partilhada; porém, se para alguns espiritualistas, a busca deve ser solitária eu penso que as muletas são necessárias até um certo ponto, até o momento em que já possamos seguir em frente com um conhecimento próprio e domínio da expressão do nosso próprio eu em consonância com o Eu Superior. Até lá, me desculpem os grandes pensadores espiritualistas que atribuem à pessoa a construção solitária do próprio caminho, independente de outras fontes de informação, mas penso que um guru, um guia, um mentor, é uma muleta inicial, uma verdade provisória que auxilie a dar os primeiros passos. Como uma criança que para se erguer se apóia nos móveis, nas pernas e nas mãos dos adultos. Depois, por si só, caminha segura definindo o próprio alvo.
A atitude correta, penso eu, é a de ouvir os mestres, considerar seus ensinamentos, mas no momento da judicação, da consideração da pertinência de suas palavras, abalizar as informações com nossas próprias experiências e ouvir a voz interna que nos faculta agregá-las ou não ao nosso proceder.
Percebo bem isso ao analisar meus percursos profissional e pessoal, em ambos tendo eu, em várias etapas da vida, a interferência de outras consciências em minhas escolhas e na constituição da manifestação do meu eu inferior, com minha anuência consciente dentro do espectro de lucidez que eu tinha no momento. Após tais influências densas cessarem e serem substituídas por outras, então mais fluidas, percebo que no transcorrer da vida no tempo, alguma liberdade mais ampla foi se manifestando, como alguém que tendo os movimentos comprometidos, esteve engessado, depois caminhou com muletas, e que ao final, bastaria uma mão segura que acompanhasse os passos. Visualizo para o meu futuro, um caminhar pessoal e livre, com pessoas para partilhar as experiências, mas não para realizar por mim a tarefa intransferível de autoiluminação.
Tenho em mente duas personagem sobre o entendimento da tarefa do guru.
A primeira é a Palas Athena da Odisséia de Homero, encaminhando Telêmaco para a vida, sem dizer o que fazer, mas sugerindo possibilidades, incutindo a fé em si mesmo e a força e a coragem de arrostar as dificuldades, a transcender a condição atual de dependência e limitação de horizontes, para a expansão da expressão do eu como alguém potente e inovador no próprio caminho.
A segunda coisa que me vem à mente, é o novo Papa, Francesco. Não sendo católica, a influência do Papa Bergoglio sobre mim não é fundamental, mas, tendo em consideração a quantidade de fiéis da Igreja Católica no planeta, vejo como importante a figura de um líder religioso que ofereça um novo paradigma de atuação e prática cristã para o homem contemporâneo. O gesto, a demonstração dos ideais dos quais é imbuído, valem mais do que discursos, ainda que sejam considerados importantes manifestos públicos de intenções e políticas. Apresentar uma conduta cristã que reforce a mensagem do Cristo: simplicidade, alegria, confiança, esperança e solidariedade.
Gurus, guias, mentores, são assim, pessoas que na sua forma de viver nos oferecem alternativas para repensarmos a condução de nossas vidas, sem que devamos segui-los cegamente ou reproduzirmos suas formas e maneiras de se posicionarem frente a vida. Essas figuras espiritualizadas que nos inspiram, deixam à todos estupefatos, justamente porque agem de maneira mais adequada às leis universais de solidariedade, de auxílio discreto, de felicidade interior. Fazem o que deveria ser normal, e, num mundo de desequilíbrios e desvios práticos dos ideais de Bem, Verdade, Justiça e Virtudes, são interpretados como excepcionais quando deveriam ser a regra.
Gurus, sao dissipadores de trevas? Sim e não. Sim porque iluminam veredas e nos fazem perceber que há algo de muito simples a ser feito e que nos parecia inexequível a um primeiro olhar. Mas não serão dissipadores de trevas se não estabelecermos uma mínima condição de intersubjetividade, ou seja, de comunicação em que algo que eles manifestem cale dentro de nós.
Sem gurus, muitos de nós não teríamos sequer vislumbrado uma nova forma de interpretar, de conceber a vida humana, e, com certeza, não devem ser endeusados nem cegamente seguidos, mas considerados na sua divina tarefa de nos reconectar conosco mesmos para a nossa própria autoiluminação.
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