O escritor extradimensional Fabio Del Santoro proferiu uma frase que me tocou bastante: "A vida nao é um quadro emoldurado na parede". Realmente, a visao de Del Santoro se encaixa perfeitamente numa compreensao de minha propria vida e dos significados que sempre procurei imprimir nela, seja por impulso proprio e consciente ou seja por imposiçao das circunstancias.
A vida é um percurso empreendido e ao mesmo tempo é a propria manifestaçao do existir. Um esforço em realizar uma tendencia ao aperfeiçoamento e ao progresso, por escolha ou por adesao às variaveis.
O famoso verso cantado por Beth Carvalho e por Zeca Pagodinho "deixa a vida me levar, vida leva eu" me faz pensar em duas possibilidades, a primeira é que é super saudavel nao tentar impor os desejos egoicos que nos fazem perder a conexao com o todo manifesto no movimento universal, procurar sim seguir o fluxo da vida sem grandes perdas de energia e tentar manter firme o equilibrio e a atitude pacifica frente aos impositivos cotidianos (quem dera eu fosse assim...!!!). Mas também me incomoda a passividade de quem segue o fluxo como massa de manobra, ser alguém que nao determina suas escolhas, que nao imprime conscientemente na vida a sua marca como ser que diz seu proprio significado e atribui significado aos seres que aparentemente nao manifestam consciencia.
Retornando à ideia de que a vida nao é um quadro emoldurado, me apaixona a visao de uma vida que vai sendo tecida à medida em que vamos nos enfronhando com as situaçoes, como um mapa riscado em amplos planos e que, na sua realizaçao, permite incursionar por veredas inusitadas que se apresentam inesperadamente. Imaginar a vida como um plano que pode sempre ser novamente esboçado a partir de cada grande renovaçao de aspectos de nossa cosmovisao.
Ao longo da vida abandonei empregos relativamente seguros com ganho modesto mas certo, posiçoes de aparente conquista no desenvolver da carreira, situaçoes de segurança pessoal como moradia propria e proximidade com os mais caros do coraçao para me enfronhar num mar de novas experiencias emocionais, culturais e espirituais, nem sempre felizes e nem sempre vitoriosas; e é claro que os atavismos mais tenebrosos sempre emergem nas pequenas crises do dia-a-dia, cobrando a "imprevidencia" e a impulsividade de meus atos; porém, observando com clareza, vejo que tentei pintar minha vida como o quadro nao emoldurado na parede, algo que nao é para ser visto em estado de finitude, de acabamento, mas algo em construçao; minha vida nao é quadro para ser observado e valorizado como modelo de beleza e cumprimento dos canones alheios.
A vida enquanto escolha deve ser vivida com espirito de paixao e aventura, procurando sempre ser coerente com os mais caros e anelados valores de nosso imo. Viver a vida como um projeto que se estende, se revela à medida em que vamos nos colocando nas cenas construidas por nos atores imersos no contexto geral.
A vida enquanto "deixa levar" também nao se restringe a um quadro imovel, mas é um reconhecimento da impossibilidade de dominarmos tudo e todos, o que nao implica em abdicarmos de sermos quem somos, de nos postarmos como joguetes.
A imagem que consigo construir é a de uma arvore maleavel ao toque do vento suave ou das borrascas, mas que ao mesmo tempo se mantem firme em suas raizes e preservada em sua essencialidade. Arvore que, aparentemente imovel, se inclina para fruir de sol e de agua, que estende as raizes e expressa a sua individualidade. A neve, o sol escaldante, a chuva torrencial, destroem alguns individuos de uma espécie vegetal, enquanto outros da mesma espécie sobrevivem denodadamente. Pintar a tela da vida em movimento revelando nosso esforço em realizar nossos intuitos e ao mesmo tempo nos permitindo vivenciar aquilo que os dias nos trazem, é um dom de sobrevivencia.
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